top of page
Buscar
V.

P. [da série: contos eróticos cafonas]

Atualizado: 30 de jun. de 2023

Já era noite quando V. me deixou na parada de ônibus. Insistiu em chamar um uber, mas eu queria muito mesmo era passear no transporte público, algo me chamava para lá. Ao nos despedirmos segurei sua nuca, o ponto fraco na passividade dele foi demonstrado com um gemido de gatinho. Entrei no ônibus, sentei no banco individual e coloquei Brujeria para tocar. Quando o ônibus passou em frente ao cemitério, eu olhei para a faixa de carros ao lado. Um rapaz dentro de um carro preto olhou na mesma hora. Segurei o olhar em direção a ele. Definitivamente a beata havia ido embora e agora o meu corpo todo parecia passar mensagens diretas e objetivas. Na sua ousadia, ele também segurou o olhar. Então sorri. Foi um sinal discreto, diferente do dele que movimentou a mão direita indicando que eu descesse na próxima parada. Virei jogadora. Continuei olhando como se ele tivesse feito um sinal que em meu país não significava nada. A parada passou e o carro sumiu de minha vista. Nessa hora a bateria da música que eu estava ouvindo deu uma virada tão linda que meu corpo todo arrepiou. O carro apareceu novamente ao lado do ônibus, ele me olhando lá de dentro. Fiz o mesmo sinal que ele havia feito, como se agora tivesse aprendido sua linguagem. A próxima parada. Desci. Comunicativa como uma atendente de feira, descobri em segundos o que ele queria que eu soubesse. P. era lutador de jiu-jitsu e isso eu soube antes de ser verbalizado. Estava visitando familiares na cidade, procurando algo para comer, dirigindo para relaxar. Ponto em comum, pois também amo dirigir para desanuviar a cabeça. Quando descemos do carro ele disse que havia tirado a sorte grande. Eu disse que era verdade. O termômetro de minha autoestima estava explodindo, mas não quis soar prepotente. Ele entendeu. E gostou. Disse que queria ir para um hotel; queria me ver de roupão entreaberto tomando um café da manhã de novela. Eu amo novelas, amo comer e amo um homem que gosta de me ver comer. Só não havia roupões naquele hotel e acredito que foi melhor assim.

3 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

.

As linhas de expressão são para quem tem coragem de chutar a apatia. A manga amadurecida é doce e eu cansei de ser fruto duro. Quero ter...

A Biblioteca de Babel

"Ninguém pode articular uma sílaba que não esteja cheia de ternuras e de temores; que não seja em alguma dessas linguagens o nome...

acatisia

é uma sensação de alívio descobrir o nome do que me assustou naquela noite. a ignorância da minha companhia de achar que era devido a...

Comentarios


bottom of page