Hoje, no banheiro do trabalho, eu vi uma aranha apreciando um besouro numa teia feita na parte inferior da porta. Não no alto. Estava onde as canelas passam adentrando o chuveiro. Como uma criança comentei com uma mulher que sequer eu havia visto o rosto, pois meu olhar parece um buraco tão profundo que evito utilizá-lo. Ela continuou a mexer no celular após milésimos de segundos de falso espanto. Enxugando as mãos na calça jeans, agachei em frente ao banquete de um alimento só. Tão devagar, tão bem construído. Fiz tantas perguntas sobre tal proeza. A localização da armadilha era tão suscetível de destruição humana. Uma aranha novata? Uma aranha sem senso de direção? Uma aranha corajosa ou uma aranha que já não tem mais nada a perder? Lembrei-me de quando I. me dizia que não era interessante enxergar sentimentos nos bichos, pois eu sentia muito e ele não queria me ver sofrer por coisas que eu não tinha certeza. A racionalidade dele me acalmava, não chegava como julgamento, até porque não era. Sinto tanta saudade de ter alguém sincero me inspirando. Eu não queria ser um besouro que cai numa emboscada tão explícita. Há várias maneiras de terminar meu raciocínio. Maneiras otimistas ou melancólicas. Mas o que eu gostaria mesmo era ficar olhando praquela teia até entender que eu não preciso entender mais nada.
V.
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